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Diário Liberdade
Sexta, 14 Outubro 2016 23:03 Última modificação em Segunda, 17 Outubro 2016 20:43

As sanções econômicas, principal barreira para o desenvolvimento de Cuba

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País: Cuba / Direitos nacionais e imperialismo / Fonte: Granma

Por Salim Lamrani

Apesar do estabelecimento de um diálogo histórico com Havana, em 17 de dezembro de 2014 e da visita oficial do presidente Barack Obama à Ilha, em março de 2016, Washington continua aplicando sanções econômicas contra a população cubana, suscitando a incompreensão da comunidade internacional.

Estabelecidas em 1960, durante a Guerra Fria, as sanções (um bloqueio econômico, comercial e financeiro ao país, n.r) perduram mais de meio século depois, ocasionam importantes dificuldades à economia cubana e infligem sofrimentos inúteis às categorias mais vulneráveis da população. Seu custo elevado e seu alcance extraterritorial motivam a recusa unânime da comunidade internacional.

Não obstante a resolução deste conflito assimétrico depende do poder executivo estadunidense, que dispõe das prerrogativas necessárias para suprimir boa parte da rede de sanções impostas à Ilha.

CUSTO DAS SANÇÕES ECONÓMICAS

Em 13 de setembro de 2016 Barack Obama renovou, por mais um ano, a Lei de Comércio com o Inimigo, uma legislação de 1917, utilizada pela primeira vez pelo presidente John F. Kennedy, em 1962, para impor sanções econômicas totais a Cuba, que prorroga o cerco econômico à Ilha. Esta lei, prorrogada cada ano pelos noves presidentes dos Estados Unidos desde essa data, só se aplica contra Havana.

Mais uma vez o impacto das sanções foi dramático para a economia e a sociedade cubanas. Em um ano, desde abril de 2015 até março de 2016, custaram US$4.6 bilhões à Ilha, segundo o ministro cubano das Relações Exteriores, Bruno Rodríguez. Em seu relatório anual acerca das sanções econômicas, as autoridades cubanas estimaram os danos causados em nível nacional. Resultaram afetados, particularmente, três setores. Primeiro, as exportações, já que Cuba não pode vender bens nem serviços aos Estados Unidos. Depois, o custo produzido pela procura de mercados alternativos geograficamente longe da Ilha. E, finalmente, o impacto financeiro, pois Cuba ainda não pode usar o dólar em suas transações internacionais, apesar das declarações do presidente Obama relativamente à supressão desta restrição. “Não existe elemento em nossas vidas no qual não esteja presente seu impacto”, concluiu Bruno Rodríguez. No total, as sanções econômicas tem custado US$125 bilhões (125.000.000 000) a Cuba, desde sua implementação nos anos 1960.

Outros setores vitais, como o da saúde, são afetados pelas sanções econômicas. Só para mencionar um exemplo, Cuba não pode obter os estimuladores cerebrais profundos, que permitem tratar das doenças neurológicas, que produz de modo exclusivo a empresa estadunidense Medtronic.

Várias centenas de pacientes cubanos com a doença de Parkinson, que se poderiam beneficiar de melhor qualidade de vida, graças a este equipamento, mas os privam dele por causa de um conflito político que opõe Washington a Havana, há mais de meio século.

ASPECTO EXTRATERRITORIAL DAS SANÇÕES

Apesar da aproximação histórica de dezembro de 2014, várias entidades internacionais foram fortemente sancionadas depois desse acontecimento por realizar, em perfeita legalidade com o direito internacional, transações financeiras com Cuba. Dessa forma, em maio de 2015, o banco francês BNP Paribas foi condenado com uma multa recorde de US$8,9 bilhões (8.900.000.000) por manter, entre outros, relações financeiras com Cuba. Em outubro de 2015, outro banco francês, Crédit Agricole, teve que pagar uma multa de US$1,1 bilhão (1,116.000 000) pelo mesmo motivo. Convém lembrar que o BNP Paribas e o Crédit Agricole não violaram nenhuma lei francesa e respeitaram escrupulosamente o direito europeu e o direito internacional.

Washington aplicou de modo extraterritorial, quer dizer ilegal, suas sanções contra Cuba. Outras entidades financeiras também foram fortemente sancionadas. Assim, o banco alemão Commerzbank teve que pagar uma multa de US$1,7 bilhões (1.710.000.000) e pôs fim a todas suas relações com Cuba. O poder executivo estadunidense tomou todas estas decisões.

MARGEM DE MANOBRA DO PRESIDENTE OBAMA

Contudo, o presidente Obama lançou vários apelos ao Congresso para convidá-lo a pôr fim ao bloqueio econômico, comercial e financeiro anacrônico, cruel e ineficiente. Expressou várias vezes sua oposição à manutenção de medidas de repressão econômicas que, além de afetarem gravemente o bem-estar dos cubanos, isolaram os Estados Unidos do cenário internacional.

Durante sua histórica viagem a Cuba alegou o seguinte: “A política dos Estados Unidos tem fracassado. Devemos ter a valentia de reconhecer esta verdade. Uma política de isolamento elaborada para a Guerra Fria não faz sentido nenhum no século 21. O embargo (bloqueio, nr) só faz dano ao povo cubano em vez de ajudá-lo. É uma saga de outro tempo que pesa sobre o povo cubano”. A comunidade mundial, favorável à resolução pacífica deste conflito, aplaudiu estas palavras.    

Não obstante, a retórica construtiva de Barack Obama não tem sido corroborada por fatos tangíveis, apesar de suas prerrogativas como chefe do poder executivo. É verdade que o presidente dos Estados Unidos restabeleceu o diálogo político com Cuba, em dezembro de 2014; ampliou o número de categorias de cidadãos estadunidense autorizados a viajar à Ilha, em janeiro de 2015; tirou Cuba da lista dos países patrocinadores do terrorismo, em maio de 2015; restabeleceu os laços diplomáticos, com a abertura das embaixadas em Washington e Havana, em julho de 2015; autorizou a exportação de bens e serviços no setor das telecomunicações, em março de 2016, (só para o setor não estatal) e facilitou a reabertura do transporte marítimo de passageiros entre ambas as nações e dos voos comerciais, em agosto de 2016.

Contudo, além destas medidas positivas, mas muito limitadas, o presidente dos Estados Unidos dispõe de toda a margem de manobra necessária para suprimir quase a totalidade da rede de sanções impostas desde 1960, sem precisar da autorização do Congresso.

Barack Obama poderá autorizar as empresas cubanas abrir contas bancárias nos Estados Unidos, para facilitar as transações comerciais e financeiras.

Poderia, também, pôr fim à perseguição financeira contra Cuba, da qual tem sofrido muitos bancos internacionais. No total, a administração de Obama aplicou multas por um montante total de US$1,4 bilhões (14.000.000.000) a diferentes entidades bancárias do mundo por suas relações com a Ilha do Caribe. Do mesmo modo, a Casa Branca poderia permitir o comércio bilateral entre as empresas cubanas e estadunidenses (importações/exportações). Também poderia consentir aos capitais estadunidenses a possibilidade de fazer investimentos em Cuba.

Também poderia, por exemplo, banir a restrição que impede que todo navio, seja qual for sua origem, que transporte mercadorias a Cuba, entre em portos estadunidenses durante os seis meses seguintes.

Só há quatros setores que o poder executivo não pode tocar sem o acordo do Congresso. O presidente Obama não pode autorizar o comércio entre as subsidiárias das empresas estadunidenses localizadas no exterior e Cuba (Lei Torricelli de 1992). Em troca, pode permitir o comércio entre a empresa matriz instalada nos Estados Unidos e as empresas cubanas, o que faz que resulte, de fato, inútil para toda transação com uma subsidiária em um terceiro país.

Do mesmo modo, Barack Obama não pode permitir o turismo ordinário em Cuba (Lei de Reforma das Sanções Comerciais, de 2000). Em troca, pode perfeitamente multiplicar o número de categorias de cidadãos autorizados a viajar para a Ilha e ampliar sua definição. Dessa forma, a Casa Branca poderá redefinir a noção da “viagem cultural” e integrar, por exemplo, a visita a um simples museu. Deste modo, todo cidadão que se comprometa a visitar um museu durante sua estadia em Cuba poderia se beneficiar da categoria de “viagem cultural”.

Sem o acordo do Congresso, o presidente Obama também não pode autorizar a venda por créditos de matérias primas alimentares (Lei de Reforma das Sanções Comerciais, de 2000). Em troca, pode perfeitamente consentir a venda por crédito de todo produto não alimentar, o que limitaria consideravelmente o impacto da sanção.

Finalmente a Casa Branca não pode permitir as transações com as propriedades estadunidenses nacionalizadas nos anos 1960 (Lei Helms-Burton, de 1996). Contudo, pode abrir a via a todo negócio que implique as demais propriedades da Ilha.

RECUSA UNÂNIME DAS SANÇÕES

Todos os setores da sociedade estadunidense são a favor do levantamento das sanções econômicas. O mundo dos negócios, mediante a Câmara do Comércio dos Estados Unidos, deseja fortemente seu fim, pois vê um mercado de 11 milhões de habitantes a 150 quilômetros das costas estadunidenses, que acolhe outros investidores internacionais.

A opinião pública favorece em mais de 70% a normalização total das relações bilaterais entre ambas as nações, pois não entende por que seu governo proíbe viajar a Cuba para fazer turismo ordinário. As autoridades religiosas, mediante o Conselho Nacional de Igrejas, têm condenado as sanções, devido ao sofrimento que infligem à população da Ilha. Os cubano-americanos, com 63% segundo a sondagem de setembro de 2016, também são a favor do levantamento das sanções, pois sabem que as medidas econômicas hostis afetam seus familiares na Ilha. É preciso lembrar que em 2015, pela vigésima quarta ocasião consecutiva, 191 países de 193 pediram o fim do bloqueio econômico, comercial e financeiro contra a Ilha, durante a reunião anual da Assembleia Geral das Nações Unidas.

UM CONFLITO ASSIMÉTRICO

Alguns observadores consideram que Cuba deve responder os gestos que realizou o presidente Barack Obama com mudanças na ordem interna. Esquecem, de fato, o caráter assimétrico do conflito. Com efeito, no conflito que opõe Washington e Havana, a hostilidade é unilateral. Cuba não impõe sanções econômicas aos Estados Unidos, não ocupa, de modo ilegal, uma parte de seu território soberano (Guantánamo), não financia abertamente a oposição interna, com o objetivo de conseguir uma “mudança de regime”, não rouba o capital humano, como faz a Lei de Ajuste Cubano, não realiza transmissões ilegais destinadas a incitar a subversão interna — como é o caso da rádio e TV Martí — outra questão é a soberania de Cuba como nação independente e segundo o direito internacional e desde o Congresso de Westfalia, de 1648, que reconhece a igualdade soberana entre os Estados, as mudanças na Ilha só cabem exclusivamente ao povo cubano, o único que pode determinar seu sistema político e seu modelo de sociedade.

CONCLUSÃO

As sanções contra Cuba são anacrônicas, cruéis e ineficientes. Têm um impacto desastroso na economia cubana e afetam duradouramente o bem-estar da população da Ilha. Apesar das declarações construtivas da Casa Branca a favor de um levantamento deste estado de cerco, ainda não foi adotada nenhuma medida de envergadura para aliviar os cubanos deste estrangulamento econômico, que perdura há mais de meio século e que a comunidade internacional condena de modo massivo. Certamente, nenhuma normalização total das relações será possível enquanto estiver em vigor esta política hostil.

* Doutor em Estudos Ibéricos e Latino-americanos da Universidade Paris, Sorbonne-Paris IV, Salim Lamrani é professor titular da Universidade de La Reunión e jornalista, especialista das relações entre Cuba e os Estados Unidos, Seu último livro se intitula Cuba, palavra à defesa! Hondarribia, Editorial Hiru, 2016.

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