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Diário Liberdade
Domingo, 05 Junho 2016 03:05 Última modificação em Domingo, 05 Junho 2016 17:08

"Nós aqui, na nossa distração"

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/ Migraçons / Fonte: Ladrões de Bicicletas
«Ser refugiado é pegar nos filhos pela mão, é arrumar a trouxa, e começar a fazer caminho. É fugir da guerra e de um sítio onde a morte é quase certa. Quem nunca ouviu uma bomba a cair por perto não consegue imaginar. Quem nunca ouviu o baque surdo da explosão de um carro carregado de explosivos não consegue imaginar. Quem nunca sentiu o sopro da deslocação de ar não consegue imaginar. Quem nunca ouviu o assobio de uma bala não consegue imaginar. Quem nunca viu corpos estropiados, não consegue imaginar. Quem nunca viu crianças mortas a serem retiradas da cave de um prédio bombardeado, não consegue imaginar. Muitos dos refugiados que nos batem à porta já viram grande parte de tudo isto. Há poucos dias, a Rainha da Jordânia, de origem palestiniana, alguém que não deve ter falta de conhecimento sobre o drama dos refugiados, visitou o campo de Kara Tepe, em Lesbos, e foi muito directa na mensagem: ninguém consegue entender a magnitude desta crise até estar frente a frente com os refugiados.»

José Manuel Rosendo (intervenção na sessão de atribuição do Prémio Miguel Portas 2016)

«Vi o bebé na água, como um boneco, de braços abertos. Peguei no bebé pelo antebraço e puxei de imediato aquele corpo leve para a segurança dos meus braços, como se ele ainda estivesse vivo. Os braços ficaram estendidos com dedos mínimos no ar, o sol a bater-lhe nos olhos luzidios, benévolos, embora imóveis. Comecei a cantar para me tranquilizar e para conferir alguma expressão àquele momento incompreensível e dilacerante. Seis horas antes aquela criança estava viva.»

Martin (socorrista alemão, algures no Mediterrâneo)

«O mediterrâneo, ao pé de nós, é um cemitério chocante. Mas só concedemos às tragédias diárias uns instantes de dor quando são em lugares próximos e as notícias nos dão a sensação irrecusável de que é uma carne igual à nossa a que foi massacrada. E mesmo assim a proximidade tem de ter intensidade mediática. Se não, passamos por ela como passamos pelos pobres de todos os dias. Adotámos a trivialidade da dor dos outros, contemporizamos com a crueza das coisas. Morremos devagar julgando que estamos numa vida protegida e dedicando-nos à sociedade informacional como se esta fosse um destino. Guardamos, quanto muito, pequenos espaços rituais para nos declararmos ainda atentos, passageiramente atentos. Sei lá se mesmo o que estamos a fazer aqui, agora, nesta Sala, não é apenas uma ritualidade contemporizadora, se não é um ato de inquietação acomodada. Se o for, a simples possibilidade de o poder ser, é o mais difícil dos incómodos. Reli ontem uma da “cartas” que Paulo Varela Gomes nos mandava da India. Na sua escrita luminosa e com a enorme energia que deixou neste mundo, falava-nos de tragédias ignoradas e de "muitas centenas de mortos a que vocês aí, embalados pelo discurso da democracia e da paz não ligaram nada", "vocês aí na vossa distração"»

José Reis (Discurso de elogio a António Guterres, no Doutoramento Honoris Causa pela Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra)

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