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Diário Liberdade
Segunda, 12 Fevereiro 2018 00:00 Última modificação em Terça, 27 Fevereiro 2018 21:30

Os comunistas iranianos e as liçons da revoluçom de 1978

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País: Irão / Direitos nacionais e imperialismo / Fonte: Blog de Nazanin Armanian

[Nazanín Armanian, traduçom do Diário Liberdade] Completárom-se quase quatro décadas desde que o povo iraniano conseguiu pôr fim à monarquia absolutista de Mohammad Reza Pahlavi, o Xá, aliado nom fiável de EUA.

 A última revoluçom do século passado acontecia no meio da Guerra Fria e ao longo da fronteira comum com a Uniom Soviética, coincidindo com outras grandes revoluçons que ameaçárom os interesses de Washington, mesmo a seguir ao falhanço do Vietname: em 1978, a esquerda tomava o poder no Afeganistám, Nicarágua e Granada.

Alheios aos jogos geopolíticos, os iranianos num movimento espontáneo e sem liderança, coreavam “Liberdade, Independência, Justiça Social”. Pensavam que a vontade do povo, junto de imensos recursos naturais, seria suficiente para estabelecer umha democracia política e económica.

As principais forças marxistas iranianas, o Partido Tudeh e Fedaínes do Povo, perseguidas duramente polo Xá (que nom parava de construir mesquitas para frear a simpatia dos jovens pola esquerda), analisavam na clandestinidade, os cárceres e o exílio a complexidade da situaçom.

A revoluçom surpreende o presidente de EUA, Jimmy Carter, quem fracassa nas suas tentativas de reforçar o regime apodrecido do Xá. É aí que o Aiatola Khomeini, um desconhecido para a geraçom jovem, é transladado do seu exílio no Iraque para a França de Valéry Giscard d’Estaing (quem seguramente nom acolheria, por exemplo, Evo Morales), quem lhe facilita o acesso aos grandes meios de comunicaçom para se dar a conhecer ao mundo e se converter no “líder da revoluçom”.

Porque a esquerda apoiou Khomeini?

- Os iranianos iríamos demorar 30 anos a descobrir que a mudança de Khomeini para Paris fazia parte de um pacto da sua equipa com os líderes do G4 (EUA, Alemanha, França e Reino Unido) e um acordo baseado nuns profundos sentimentos anticomunistas partilhados: O G4 iam entregar o poder em troca de impedir a influência dos comunistas e da Uniom Soviética no novo regime. É assi que Carter força o Xá a abandonar o país a 16 de janeiro, para que Khomeini aterre com um Airfrance, escoltado polo F-4 Phantom, em Teerám a 11 de fevereiro, criando entre os iranianos a miragem do “triunfo da revoluçom”. Esse acordo é mencionado polo jornalista e secretário de imprensa de J.F. Kenedy, Pierre Salinger (1925-2004) no seu livro “America Held Hostage by Iran”.

- Desconhecer as relaçons secretas entre a República Islámica (RI) e EUA. O filme Argo também oculta que em 1980 o candidato republicano Ronald Reagan e o primeiro-ministro israelita Menahim Begin, com o fim de impedir a reeleiçom de Carter, pactuaram com a RI para manter retidos aos servidores públicos da embaixada de EUA em Teerám durante a campanha eleitoral de EUA, a mudança de receber dinheiro e armas. E assim foi feito. O mesmo dia 20 de janeiro de 1981 que Reagan jura o seu cargo, o Irám liberta os reféns. Também em 1987 saiu o escándalo Irámgate, que assinalava as relaçons ocultas entre o Irám, Israel e EUA.

- O apoio de Uniom Soviética à RI arrastou os comunistas iranianos: a saída do Irám da órbita ocidental “parecia” favorecer o campo socialista. Hoje, um importante setor de esquerda mundial fai o mesmo seguidismo com Moscovo, que se entom era um erro, agora que o capitalismo se instalou no Kremlin, é incompreensível. Que a URSS fosse o primeiro país a reconhecer Israel (porque os EUA apoiavam os países árabes), nom significa que os partidos comunistas árabes deveriam fazer o mesmo.

- Nom ser capaz de decifrar a nova política dos EUA, que consistia em debilitar ou eliminar as potências da regiom, independentemente de se eram aliados ou nom. A queda do Xá mostrou como um fantoche poderoso pode ser derrubado, e deixar desprotegido “os seus interesses” numha zona tam estratégica. Por isso o objetivo de Washington nom foi a RI, e si o Irám. Por isso, traçou a doutrina de “Dupla contençom” (a do Iraque e Irám a benefício de Israel), provocando umha guerra de 8 anos entre ambos os países. Depois de conter o Iraque, toca reduzir o Irám. Assim, os EUA desmantelárom países como a Líbia e a Síria, e inclusive tentárom eliminar Tayyeb Erdogan, na Turquia.

- O desconhecimento do Islám, o programa do Islám político. Era a primeira vez que a casta clerical xiita se fazia com o poder. Que o Corám estivesse escrito em árabe, e mal traduzido para o persa, impossibilitava o acesso direto ao seu conteúdo. Também nom conhecíamos a Sharia, que depois foi introduzida no código penal e civil, nem tínhamos lido o livro Tozihol Masael de Khomeini, proibido na era do Xá. Poucos sabiam que em 1964 o Xá enviou o aiatola para o exílio (que nom para a prisom ou para a morte, como fazia com os comunistas) pola sua oposiçom a dous dos seus planos de reforma: outorgar o direito ao voto à mulher e a “desamortizaçom” das terras em maos do clérigo latifundiário.

- A duríssima repressom exercida polo Xá contra as forças democráticas durante décadas tinha eliminado qualquer outra alternativa. O Partido Comunista Tudeh tinha nas prisons do Xá os presos políticos mais veteranos do mundo, que depois fôrom executados pola RI.

- Acreditar nas promessas do Aiatola Khomeini em Paris, de que ia respeitar as liberdades políticas e sindicais, inclusive legalizaria o Partido Comunista (entrevista com Eric Rouleau de Le Monde), que o véu ia ser voluntário (entrevista com Oriana Fallaci), e que nom aplicaria as leis da Idade Média. Dito discurso, junto do aspeto austero (se comparado com o luxo do Xá), e o aparecimento contundente da Teologia Cristá de Libertaçom na América Latina, gerou esta ideia de que ele representava a inexistente Teologia Islámica de Libertaçom. Umha vez no poder, demo-nos conta de que tinha recorrido a taghiyya (disimulo, mentira), princípio que permite aos xiitas ocultarem a verdade.

- Nom dar importáncia aos adjetivos religiosos que os islamistas uniam às consignas da esquerda (Liberdade, justiça, dignidade, etc.): Assim, a justiça islámica teria dois significados principais: 1) Castigos Islámicos, como a Lei de Taliom, a Lapidaçom, etc. e 2) Caridade e pagamento de esmola, a eterna fórmula dos ricos para manter o controlo sobre os estômagos vazios. Quanto à liberdade, só existirám partidos "islámicos", porque os outros partidos nom estám mencionados no Corán. O mais desconcertante foi o uso do termo "oprimido" como que "o islám pertence aos oprimidos, nom aos opressores". Referiam-se aos "perseguidas pola sua fé", como afirmam os textos sagrados, que nom aos trabalhadores explorados! No islám, a propriedade é sagrada, e enquanto nom há pior pecado que ser ateu, um banqueiro e um operário devem rezar ao mesmo Deus. Por isso, a Constituiçom islámica divide os cidadaos em fiéis e nom fiéis (que merecerám a morte por isso), mussulmanos e nom mussulmanos, mulheres e homens, todos desiguais ante a lei. A presidência e os altos cargos, por exemplo, estám reservados só para varons, xiitas e fiéis lhe ao chefe do Estado.

iran79- Considerar que a independência de um sistema político das potências ocidentais per se era "progressista", embora se tratasse de um totalitarismo obscurantista. Décadas de vínculos humillantes entre a monarquia do Xá e EUA tinham nublado as nossas mentes. A independência que reclamam os islamistas deve a 1) o seu olhar “feudalista e tribal” com respeito aos limites do seu “domínio”, e 2) para nom responder perante os organismos internacionais polos seus atos, como a execuçom de menores, os direitos da mulher, das minorias religiosas ou dos trabalhadores.

- Confundir o “anti-estrangeirismo” da RI e a sua “anti-modernidade” com ser “anti-imperialista”. Os islamistas do Irám, podem dar-se mal com os EUA e de maravilha com a Alemanha ou Itália. E embora podam parecer anticapitalistas –porque as novas relaçons de produçom ameaçam a sua poder e influência–, a sua ideologia está baseada na economia de mercado precapitalista.

Ingenuidade sobre a personalidade de Khomeini, e a crença de que era sensato e sincero, evitaria ao menos a corrupçom, e que desde a política de “critico e apoio” poderia influir-se sobre as suas decisons a favor do povo. Influir sobre um sacerdote idoso, fanático, que pensava ser um enviado de Alá e a sua prioridade era recuperar “as terras mussulmanas” e nom repartir pam e paz... Em 1981 recusou a oferta de Saddam Husein de pôr fim à guerra, porque “A guerra é umha bençom de Deus” dixo, e prolongou-na mais sete anos, sem nengum resultado que nom fosse a morte de centenas de milhares de jovens, a mutilaçom de milhons e umha economia em falência em ambos os países. Sob a cortina de fumaça da guerra patriótica, a ultradireita religiosa esmagou todas as forças políticas, sindicais, feministas, estudantis. O seu sucessor oficial, o aiatola Montazeri, acusou-no publicamente de assinar mediante pena de morte dezenas de milhares de presos políticos inocentes. Falou da “pedagogia do terror” dos tribunais de inquisiçom e, depois, renunciou ao seu cargo.

- Medo a cair no “esquerdismo”. A esquerda confundiu o respeito às pessoas crentes com respeitar e aceitar as suas crenças (como hoje lhe acontece à esquerda europeia). Em 1982, a RI, ao aprovar “A lei dos que entram em guerra com Deus”, baseada nos textos sagrados, e parecido com Lei Patriot de George Bush, criou um Estado policial. Como é possível umha mínima justiça social se nom existe nengum controlo democrático sobre um poder (e umha caixa cheia de petrodólares), de quem afirma que só responde perante Deus? Os mesmos que em 1979 prometeram água e luz gratuitas para toda a populaçom, lançárom metade abaixo da linha da pobreza.

- Votar a umha Constituiçom que instaurava pola primeira vez no Irám um califado dirigido por umha cúria de clérigos, capaz de anular todos os órgaos eleitos da “República”.

- Nos primeiros três anos, a RI construiu estradas, moradas, hospitais nas zonas rurais e depois deixou de o fazer, enquanto destruía a classe média do país. Repartia a pobreza e nom a riqueza. Converteu o lumpen proletariado (nom os trabalhadores) na sua base social, dando-lhes poder, bem-estar e armas, para que vigiassem e perseguissem os seus vizinhos e irmaos. Som os que hoje componhem dezenas de organismos religioso-militares num Estado nacional-islamista. Nom perguntem porque cada ano uns 170.000 iranianos titulados universitários saem do país para nom regressar!

- Reduzir a importáncia das liberdades políticas e pessoais, dando umha prioridade irracional à luita anti-estadounidense da RI, ignorando que sem o apoio efetivo do povo à RI, esta nom poderia resistir as pressons de Washington. E hoje, segundo um inaudito inquérito publicado pola imprensa oficial, 73% da populaçom declara-se descontenta com o regime. Assi, os comunistas impedírom greves da classe operária –que tinha esperado décadas para melhorar a sua situaçom–, porque “debilitavam a revoluçom”, “faziam o jogo ao inimigo”, enquanto a RI proibia sindicatos independentes. Fôrom despojados das suas únicas armas. Milhares de sindicalistas e operários fôrom detidos, e centenas executados. O mesmo a respeito do direito da autonomia das minorias étnicas, que componhem 60% da populaçom. Acusá-las de separatismo é criar caldo de cultura para os planos dos EUA para desintegrar o Irám.

- Aceitar o sacrifício das liberdades em troca de melhorar na situaçom dos pobres. Esta visom destrói os princípios do marxismo! Os trabalhadores precisam é de partidos comunistas e de sindicatos para defenderem os seus direitos. Ninguém mais vai fazê-lo por eles.

- Nom reagir perante a proibiçom da música nom religiosa, o baile, a arte, as festas milenarias persas, as cores vivas na vestimenta. A RI nom pôde criar umha sociedade devota, e decidiu realizar umha profunda restauraçom religiosa, proibindo todo sinal de alegria e felicidade.

- Padecer a mesma doença que grande parte da esquerda mundial: ser insensível diante da repressom dos adversários. A RI exerceu umha violência despiadada contra todas as forças que considerava inimigas, mas astutamente dividida em etapas: Primeiro foi polos monárquicos e os militares; depois, pola minoria religiosa baaí e mujaidin do povo (grupo islamista de direita), a esquerda radical, os mussulmanos progressistas, etc, e quando fôrom polos comunistas, já conhecem o resto do poema. Hoje, esta “esquerda mundial” continua a silenciar a tortura e a pena de morte lá onde é exercida por um regime ou grupo “amigo”. No que levamos de 2018, três pessoas fôrom enforcadas por delitos que cometeram quando tinham 15 anos.

- Nom captar o perigo do aumento do poder político e económico das forças armadas islámicas, talvez polo papel progressista que tinham jogado os militares no movimento do nacionalismo árabe.

Em 1982 os marxistas iranianos dérom por fracassada a revoluçom. Desde entom, o futuro da Revoluçom Islámica só depende dos seus gestores.

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