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Diário Liberdade
Terça, 02 Mai 2017 14:07 Última modificação em Sábado, 06 Mai 2017 04:22

Foi bonita a luta, Pá! Agora, é seguir na ofensiva até a derrubada do governo usurpador!

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Edmilson Costa

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[Edmilson Costa*] Brasil, zero hora do dia 28 de abril. Os comandos grevistas começam a fechar as garagens dos ônibus, uma a uma, em praticamente todos os Estados e no Distrito Federal. Começava a greve geral vitoriosa no País. O metrô iniciou sua paralisação ainda pela madrugada nas principais capitais e, mesmo com a tentativa de colocar funcionários administrativos para operar as máquinas, a paralisação ultrapassou os 90%. Os metalúrgicos de vários Estados também cruzaram os braços e não foram trabalhar, assim como petroleiros, operários da construção civil, estivadores, funcionários dos correios, bancários e professores de várias capitais e grandes cidades. Boa parte do comércio também fechou e aqueles estabelecimentos que abriram praticaram ficaram às moscas, porque não tinham a quem vender. No total, cerca de 92 categorias de trabalhadores aderiram à paralisação, representando assim a maior geral da história do Brasil.


A partir das cinco da manhã, comandos móveis formados por militantes partidários e dos movimentos sociais bloquearam as principais ruas e avenidas das grandes metrópoles, além das estradas de acesso às regiões metropolitanas, colocando pneus e ateando fogo, de forma a construir grandes barricadas para bloquear o trânsito nas principais vias de circulação de caminhões e automóveis. Muitos também se reuniram nas paróquias para planejar as mobilizações e piquetes. Em São Paulo a polícia invadiu uma igreja para prender manifestantes. A polícia reprimiu violentamente e prendeu vários militantes, mas os protestos continuaram pelas ruas e avenidas ao longo do dia em centenas de cidades brasileiras. Nada impediu que o 28 de abril parecesse um domingo ou um dia de grande feriado.

Dessa histórica jornada de lutas participaram cerca de 40 milhões de trabalhadores de Norte a Sul do País, de acordo com as centrais sindicais que convocaram a greve geral. Da Zona Franca de Manaus, no Estado do Amazonas, passando pelas plataformas marítimas da Petrobrás, metalúrgicos da região Centro-Sul, petroleiros de vários Estados, os transportes em geral (metrô, ônibus e trens), estivadores, milhões de professores municipais, estaduais e das universidades, inclusive professores da rede privada, bancários das principais cidades brasileiras, serviços em geral. Até o comércio nas grandes capitais paralisou suas atividades: a Rua 25 de março, principal centro comercial paulista, estava como num dia de domingo. Ainda pela manhã, em várias regiões do País ocorreram grandes manifestações de ruas, encerrando-se ao final da tarde em São Paulo, no Largo da Batata, com uma manifestação de mais de 70 mil pessoas, que marcharam até a casa do presidente usurpador. Mas um  milhão de pessoas estiveram nas ruas para protestar contra as reformas da previdência, trabalhista, as terceirizações e o ajuste fiscal.

A repressão também foi muito grande em várias regiões do País. No Rio de Janeiro, a selvageria da polícia se destacou pela brutalidade, com as forças repressivas atacando os manifestantes e  deixando vários feridos. Em Goiás, uma cena dantesca simbolizou a ação do aparato repressivo: um comandante policial avançou furioso contra um grupo de jovens e acertou uma paulada tão violenta no rosto de um jovem que o cassetete de madeira quebrou. O jovem está entre a vida e a morte em um hospital da cidade. Na Baixada Santista, região operária de São Paulo, onde está o maior porto do País,  a repressão contra os estivadores foi violenta, não só através da tropa de choque, mas também da cavalaria que avançou violentamente contra os grevistas, deixando vários deles feridos e hospitalizados. Na manifestação da capital de São Paulo a polícia também jogou bombas contra manifestantes, mas a repressão foi menor que nas outras regiões.

Mas não foram apenas as grandes metrópoles que realizaram greves e protestos contra o governo usurpador. O Brasil profundo, constituído pelas pequenas e médias cidades do interior, também realizaram manifestações. Por exemplo, foram realizados atos contra o governo em Bujari, no Acre; Marituba, no Pará; Gurupi, no Tocantins; Arapiraca, em Alagoas; Assu, no Rio Grande do Norte; Lauro de Freitas, na Bahia; Juari,  no Mato Grosso; Sabará, Minas Gerais; Tatuí, São Paulo e Ijuí, no Rio Grande do Sul. Isso sem contar as cidades de porte médio, onde em quase todas ocorreram manifestações contra o governo.

Vale ressaltar que a greve geral de 28 de abril contou ainda com uma vasta frente de luta, que incluiu não apenas os sindicalistas, movimentos sociais e partidos políticos, mas também a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), cujos religiosos se utilizaram das redes sociais e dos sermões para chamar a população para a greve geral. Também houve apoio à greve entre religiosos protestantes e a Ordem dos Advogados do Brasil, além de associação de magistrados, membros do ministério público do trabalho, atores e vários artistas, sendo que alguns, como Gal Costa, cancelaram shows em apoio à greve. Além disso, contou também com a simpatia popular. Não foi visto as costumeiras aglomerações de pessoas nas filas de ônibus, nas estações de metrô ou nas estações ferroviárias. As pessoas preferiram ficar em casa a sair desesperadamente em busca de transporte alternativo para chegar ao trabalho.

À exceção do grande capital, da oligarquia financeira, dos monopólios comerciais e do agronegócio, o País inteiro apoiou o movimento. Isso pode ser constatado nas pesquisas de opinião: Temer tem quase a unanimidade do País contra seu governo. Apenas 9% apoia sua gestão e mais de 90% da população são contrárias às reformas que estão sendo votadas no Congresso. Como se trata de um governo que se assemelha a uma quadrilha e um Parlamento cheio de corruptos, não é de se espantar tamanha impopularidade. Mas espantoso ainda é verificar que essa quadrilha, que deveria estar na cadeia, é exatamente quem está votando a devastação social contra o mundo do trabalho.

O governo e a mídia tentam desqualificar o movimento

Diante da grandiosidade do movimento grevista, o governo e a mídia corporativa procuraram, de todas as formas, desqualificar o movimento. O ministro da Justiça, um dos acusados de corrupção na Operação Carne Fraca, veio a público dizer que o movimento era pífio e coisa de baderneiros. O próprio presidente, através de nota, fez ouvidos de mercador e disse que as manifestações não iriam mudar o processo das “reformas” e que o congresso daria continuidade às votações. O caricato prefeito de São Paulo, João Doria, anunciou na véspera que teria feito um acordo com o Uber e o 99 (aplicativos de taxis) para transportar gratuitamente os funcionários até o trabalho. Mas o link que permitia as viagens gratuitas vazou e as pessoas passaram a recomendar que esse mecanismo fosse utilizado para que todos se dirigissem à manifestação no Largo da Batata. Diante do fracasso da empreitada, Doria foi obrigado a anunciar o cancelamento do acordo com os aplicativos de taxis. Mas o subprefeito da região de Pinheiros, também na capital, forçou os funcionários a dormirem no trabalho e agora vai ser processado por assédio moral.

Papel especial na desinformação teve a mídia corporativa, especialmente a Rede Globo, o maior monopólio de comunicação do País. No dia anterior, seus jornais e redes de televisão sequer anunciaram que haveria uma greve geral no País. Mesmo diante da grandiosidade da greve, a cobertura da televisão foi profundamente manipuladora, pois as chefias estavam orientadas a desacreditar o movimento. Assim, evitou-se a palavra greve geral, buscou-se caracterizar a greve como apenas dos transportes, que impediam a população de ir e vir; deu-se especial cobertura às cenas de confronto para associar a greve à baderna e buscou-se entrevistar trabalhadores dizendo-se prejudicados com a greve.

Mas nem as desqualificações do governo, nem a manipulação da mídia foram capazes de influir no ímpeto grevista dos trabalhadores. Como depois se soube, nos bastidores o governo sentiu o golpe e nos salões da burguesia deve ter havido muito medo e pânico afinal, após duas décadas de refluxo do movimento operário, os trabalhadores voltaram à cena com unidade e força política. Realizaram uma greve política numerosa e vitoriosa, nunca imaginada pela burguesia, em função das condições adversas da conjuntura. O País está há quatro anos em severa recessão, com cerca de 20 milhões de desempregados (incluindo os desempregados oficiais e os que deixaram de procurar emprego e não são contabilizados mais nas estatísticas) e o governo realiza uma ofensiva midiática permanente buscando fazer crer que as reformas vão modernizar o País e trazer de volta os empregos. Nada foi capaz de barrar a força da unidade do movimento operário, popular e da juventude. Um indício desse processo foi uma nota da Federação do Comércio de São Paulo que calculou em R$ 5 bilhões (U$ 1,7 bilhão) o prejuízo com a greve.

As lições da greve geral

Os primeiros ensinamentos da greve geral no País revelam que quando os trabalhadores, o movimento popular e da juventude entram em cena de forma unitária são capazes de mover montanhas. A partir de agora a luta de classes no País mudou de qualidade: está dirigida pelos trabalhadores, suas organizações e seus métodos de luta. Para os pessimistas, que imaginavam que o proletariado estava acomodado diante dos ataques da burguesia, a greve demonstrou que os trabalhadores entram em cena na hora certa, quando as condições objetivas e subjetivas estão maduras para grandes ações de massa. Mesmo diante da greve vitoriosa, não se pode cair no ufanismo: este foi o primeiro ensaio geral de uma longa jornada de lutas, cujo desfecho será mais ou menos profundo de acordo com a intensidade das ações do movimento operário nos próximos meses.

Vale lembrar ainda que a greve geral de 28 de abril não caiu do céu nem foi fruto da espontaneidade das massas, que de uma hora outra resolveram cruzar os braços contra o governo e seus patrocinadores. As manifestações contra o golpe vinham sendo realizadas já há algum tempo, muito embora ainda fossem difusas e com elevado grau de espontaneidade. Por exemplo: nas olimpíadas, quando Temer anunciou a abertura dos jogos recebeu uma estrondosa vaia. Também ocorreram protestos nos estádios de futebol, em shows artísticos, escrachos contra parlamentares golpistas nos aeroportos, dezenas de protestos de rua, até que se pôde sentir o ânimo das massas nas  manifestações e protestos unificados do dia 08 de março, o dia internacional de luta das mulheres, e as do de 15 de março, o dia nacional de mobilizações e paralisações. Portanto, a greve geral de 28 de abril foi o resultado de um processo de amadurecimento que vinha se gestando há tempo entre os trabalhadores e que se expressou de forma organizada neste 28 de abril. 

 A greve assestou um duro golpe contra as manipulações da mídia e as mentiras do governo em relação às contra-reformas e trouxe para o centro da luta um novo personagem: o movimento operário e popular. Por maior que tenha sido a desinformação e a propaganda oficial, trabalhadores de todo o País e de dezenas de categorias demonstraram a força política do proletariado brasileiro, ressaltando que a manipulação mediática já não tem mais o poder que tinha no passado. Os trabalhadores brasileiros, cansados dos ataques do governo e das denúncias de corrupção na Administração Pública e no Parlamento, simplesmente prefiram acreditar nas suas entidades representativas do que nas mentiras da Rede Globo.

A greve revelou também, de forma pedagógica, o imenso potencial dos trabalhadores na luta por seus direitos e por uma vida melhor. Ensinou que os trabalhadores são a força mais importante do País, pois quando param de trabalhar, as cidades param e o País também pára. Por isso, essa greve geral terá efeitos de curto, médio e longo prazo no imaginário popular e contribuirá de maneira efetiva para fortalecer a organização e o ânimo dos trabalhadores.  Também terá repercussão junto à classe dominante, porque agora a burguesia sabe que os trabalhadores começaram a virar o jogo, instituindo uma nova dinâmica na luta de classes. Por isso, vão procurar de todas as formas dividir o movimento, cooptar e corromper suas lideranças mais vacilantes. Mas a força da greve foi tão grande que qualquer líder sindical  que decida fazer o jogo do governo poderá ser desmoralizado rapidamente.

Em outras palavras, a luta de classes mudou de patamar no Brasil. Portanto, nessas novas condições e diante da heterogeneidade das regiões e da luta social brasileira, a esquerda deve não só intensificar as gestões para manter a unidade dos trabalhadores, mas também combinar diversas formas de luta contra a burguesia e o aparato repressivo. É fundamental parar as fábricas, o comércio e o transporte, mas também é muito importante formar e fortalecer os Comitês Populares Contra as Reformas e multiplicar de maneira acelerada os comandos móveis para parar a circulação nas grandes metrópoles. Quando maior o número de comandos mais dificuldades terá o aparato militar para reprimir os lutadores. E todo esse trabalho deverá ser condensado em grandes manifestações de rua, capazes de inviabilizar a repressão. Uma coisa é reprimir cinco ou dez mil manifestantes. Outra é atacar uma manifestação de 100 ou 200 mil pessoas.

Os próximos passos

A dinâmica da luta de classe desencadeada pela greve deve merecer da esquerda socialista uma atenção especial. É fundamental manter a centralidade da luta nas ruas, nos locais de trabalho, estudo e moradia e junto ao povo pobre dos bairros, de forma a evitar que o movimento seja canalizado apenas para as eleições em 2018. Essa é uma tarefa fundamental, pois existem várias forças que, apesar de ter contribuído para o sucesso da greve geral, não querem levar às últimas consequências a luta contra o governo usurpador porque ainda vivem a ilusão de que tudo pode mudar com as eleições. Para derrotar esse governo corrupto e ilegítimo é fundamental intensificar a luta de massas, colocar novas tarefas na ordem do dia para os trabalhadores.

Também é fundamental que a nota divulgada pelas centrais sindicais dia primeiro de maio se transforme em realidade prática. As centrais exigem a retirada das propostas que tramitam em Brasília, reafirmam a luta pelos direitos previdenciários e trabalhistas e o compromisso com a unidade do movimento e prometem ocupar Brasília para pressionar o governo e o Congresso a reverem seus planos de ataques aos trabalhadores e, se isso não for suficiente, assumem o compromisso de organizar uma reação ainda mais forte. Os elementos centrais da posição das centrais é um bom ponto de partida para refletirmos sobre os próximos passos.

Entendemos que é fundamental ocupar Brasília, com uma grande manifestação de mais de 100 mil pessoas, e forçar o Congresso Nacional a revogar todas as medidas antipopulares. Mas esse fato terá maior efeito se os trabalhadores estiverem parados em todo o País, por um tempo maior do que a greve do dia 28 de abril. Portanto é importante discutir com as centrais a necessidade de uma greve geral combinada com uma grande manifestação em Brasília. Os trabalhadores já demonstraram sua disposição de luta. O governo está cada vez mais impopular. Portanto, aqui vale a palavra de ordem cantada nas manifestações de rua: “Ai, ai, ai, empurra o Temer que ele cai”.

Achamos também que está na ordem do dia a construção do Encontro Nacional dos Trabalhadores e do Movimento Popular, de forma a discutirmos um projeto para o País, organizado a partir das bases do movimento operário e popular, de forma a construir uma ferramenta que se transforma em referência de combatividade e organização para as massas e que seja capaz de elaborar um programa alternativo para reconstruir o Brasil na perspectiva dos interesses populares.

*Edmilson Costa é secretário-geral do PCB

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