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Segunda, 19 Dezembro 2016 01:22 Última modificação em Quarta, 28 Dezembro 2016 15:25

'Essas organizações de direita não são novidade na história do Brasil', diz o cientista social Diego Batista Rodrigues de Oliveira Destaque

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País: Brasil / Reportagens / Fonte: Diário Liberdade

Recentemente, o Diário Liberdade entrevistou a militante e professora Clarisse Gurgel sobre as recentes manifestações de direita no Brasil. Dando continuidade a esse debate, trazemos outra entrevista, agora, sobre as principais organizações de direita que estão por trás dessas manifestações. O entrevistado da vez é o cientista social Diego Batista Rodrigues de Oliveira. Integrante do Grupo de Estudos de Política da América Latina da Universidade Estadual de Londrina, atualmente, Diego pesquisa sobre as classes médias brasileiras e seus posicionamentos político-ideológicos.

Diário Liberdade - Quais são as principais organizações de direita hoje no país por trás das manifestações "anticorrupção"? Quais as diferenças e semelhanças entre elas? Houve grupos semelhantes na história do Brasil?

Diego Batista Rodrigues de Oliveira - Acredito que as principais organizações que podemos colocar no espectro da direita, e que estão por trás das manifestações “anticorrupção”, são o Movimento Brasil Livre (MBL), o Vem Pra Rua (VPR) e o Revoltados Online (ROL). Apesar de os três grupos compartilharem de um discurso anti-petista, o ROL defende um estado forte e autoritário, e a intervenção militar como solução para os problemas do país, o que o distancia das bandeiras defendidas pelos outros movimentos e também da maior parte do público presente nas manifestações “anticorrupção”. O MBL e o VPR, possuem pautas mais parecidas, ambos partilham de um discurso liberal e defendem uma redução do Estado e da burocracia, mas também possuem suas divergências: o VPR, por exemplo, foi o último a levantar a bandeira do impeachment da Dilma, e o fez depois de receber fortes críticas. Na última manifestação do dia 4 de dezembro, o VPR estava mais mobilizado que o MBL e chegou a convocar pessoas de diferentes posicionamentos políticos, seja de direita ou de esquerda, para participar das manifestações a favor das 10 medidas anticorrupção, o que também levou a críticas por parte do MBL. Essas organizações de direita não são novidade na história do Brasil, elas surgem em contextos históricos específicos, como são os casos do movimento integralista na primeira metade do século XX e dos movimentos por trás da Marcha da Família com Deus pela Liberdade, em 1964, que serviu de base popular para o golpe militar. A novidade nesses movimentos está na defesa de um Estado mínimo, como é o caso do MBL e do VPR, e na forma como eles se apropriam das redes sociais, defendendo seus posicionamentos a partir de uma linguagem bastante acessível.

Diário Liberdade - Você relaciona essa "nova direita" a quais causas sócio históricas? E qual o papel dos think thanks liberais e conservadores?

Diego Batista Rodrigues de Oliveira - Esses grupos surgem num contexto pós-junho de 2013, que se iniciou com os protestos organizados pelo Movimento Passe Livre e que culminou numa miríade de reinvindicações com pautas muito difusas. Em 2014, diante de uma crise político-econômica propagada diariamente pelos principais meios de comunicação, e com a reeleição de Dilma Rousseff por uma vitória com pequena margem, ainda somada aos escândalos vindos à tona com a Operação Lava Jato, grupos ligados ao Estudantes Pela Liberdade (EPL), uma espécie de filial brasileira da Students For Liberty, viram uma oportunidade para atuar nas ruas. Em entrevista dada a Agência Pública, Juliano Torres, diretor executivo da EPL e um dos fundadores do MBL, junto com Fábio Ostermann e Felipe Melo França, fala como surgiu a ideia de criar a marca MBL para poder participar das manifestações sem comprometer organizações americanas, que são proibidas pela legislação dos EUA de doar recursos para ativistas políticos. Uma dessas organizações é a Atlas Network, principal financiadora da Students For Liberty, responsável por desenvolver programas, treinamentos e financiamento de think tanks. Na mesma entrevista, Juliano Torres, aponta Kim Kataguiri, um dos principais coordenadores do MBL, como membro da EPL. O papel das think tanks é fundamental na atuação desses jovens, pois promovem cursos de formação e treinamentos que tem como objetivo principal formar lideranças que defendam e difundam os ideais liberais.

Diário Liberdade - Como a tecnologia e as redes sociais são utilizadas por esses grupos? E a grande mídia?

Diego Batista Rodrigues de Oliveira - Esses grupos conseguem utilizar as redes sociais de maneira muito eficiente, mantêm um conteúdo que é constantemente atualizado e de fácil compreensão, com muitos vídeos e textos curtos com um tom bastante sarcástico e frases de efeito. Também possuem um alto número de seguidores nas redes sociais e uma considerável capacidade de mobilização social. No entanto, no que se refere a capacidade de mobilização, não podemos atribuir todo o “sucesso” das manifestações contra a corrupção e, sobretudo, a favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, exclusivamente à ação desses grupos. É claro que eles são importantes, pois estabelecem um contato explícito e direto com a população através das redes sociais. Porém, os grandes meios de comunicação tiveram um papel fundamental que influiu diretamente no número de pessoas que foram as ruas, sobretudo, no dia 13 de março deste ano, devido à constante divulgação dos atos nos dias que o antecederam e pela cobertura dada por algumas emissoras de televisão, abertas e fechadas, que chegaram a alterar sua programação regular. Além desse “apoio indireto” dos grandes meios de comunicação na convocação das manifestações, algumas das lideranças desses movimentos ganharam espaço em alguns canais de comunicação, como é o caso do Kim Kataguiri, uma das lideranças do MBL, que possui uma coluna semanal no jornal Folha de S. Paulo. Além do fato de sempre serem convidados para darem entrevistas em rádios e jornais sobre os desdobramentos da política nacional.

Diário Liberdade - Nas últimas eleições municipais, o MBL, por exemplo, elegeu alguns candidatos em siglas como o DEM. Acha que esse é o futuro desses movimentos? Ou seu principal foco será na linha auxiliar "civil" do governo, como no caso da perseguição e combate às recentes ocupações estudantis?

Se pegarmos o MBL e o VPR, o posicionamento de ambos os movimentos em relação participação nas eleições é distinto. Segundo Rogério Chequer, que é um dos fundadores do VPR, o movimento, por ser suprapartidário, optou por não lançar candidatos nas eleições municipais de 2016, porque isso poderia comprometer o posicionamento crítico do movimento em relação aos partidos e políticos. Neste caso, o VPR diz não apoiar nenhum político incondicionalmente, eles defendem as políticas que vão ao encontro de seus interesses e rechaçam as que vão no caminho oposto. Por isso, os membros do VPR que optaram por participar das eleições tiveram que se desvincular do movimento, mas isso não impede que, após o término das eleições, aqueles que não conseguiram se eleger voltem ao movimento. Em relação ao MBL, que também se diz um movimento suprapartidário, o fato de seus membros e coordenadores concorrerem às eleições por diversas legendas que tem políticos envolvidos em casos de corrupção (DEM, PSDB, PMDB, entre outros), não é visto como uma contradição aos interesses do movimento. Segundo eles, os candidatos eleitos do MBL têm autonomia no interior dos partidos para colocar os interesses do movimento acima dos interesses do partido sempre que esses se chocarem. E, como na perspectiva de suas lideranças, não existe um partido claramente liberal no Brasil e pelo fato de que os trâmites para fundar um partido do MBL seria muito demorado e tiraria o foco das ações do movimento, eles deliberaram por concorrer pelas siglas tradicionais já existentes, excluindo as tradicionais de esquerda, como PT e PCdoB. Tanto que o MBL não poupa críticas ao presidente do Senado, Renan Calheiros, do PMDB, e ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, do DEM, mesmo partido pelo qual concorreu o vereador eleito do MBL em São Paulo, Fenando Holiday.

Apesar de o MBL ter conseguindo eleger representantes nas câmaras municipais de algumas cidades, o foco principal do movimento hoje não é a disputa eleitoral. No entanto, as atuações nas desocupações de escolas e universidades, e em outras ações promovidas pelo movimento, podem vir a contribuir para uma maior viabilidade eleitoral. É importante ressaltar também o fato de que o MBL está presente em várias universidades públicas no Brasil, através de movimentos estudantis como Unesp Livre, Unicamp Livre e USP Livre.

Diário Liberdade - Jovens ou pessoas mais velhas tendem a ser atraídas por esses movimentos?

Diego Batista Rodrigues de Oliveira - Os coordenadores e as lideranças desses movimentos são predominantemente jovens, no entanto, pelas pesquisas realizadas com a população presente nas manifestações organizadas por esses grupos no decorrer de 2015 e 2016, constata-se que esses movimentos conseguem mobilizar setores mais velhos da população. Tanto que, no último congresso nacional realizado pelo MBL, em novembro deste ano, o qual foi aberto ao público que estivesse disposto a pagar R$50,00 por cada um dos dois dias do evento, pude concluir, através das minhas observações, apesar de não utilizar nenhum método de comparação, há predomínio de um público mais velho, sendo que a maior parte dos jovens presentes no evento tinham vínculo direto com o MBL, integrantes ou coordenadores.

Diário Liberdade - Por fim, acha que essas organizações tendem a crescer num contexto de ferozes ataques aos trabalhadores e à população - como no caso da atual reforma da previdência?

Diego Batista Rodrigues de Oliveira - O MBL e o VPR defendem pautas liberais do ponto de vista econômico, portanto, consideram fundamentais as reformas promovidas pelo governo Temer, como a PEC 55 (aprovada recentemente), a reforma da previdência e a reforma trabalhista, para a retomada do crescimento econômico. O discurso utilizado por esses movimentos, segue a mesma linha do atual governo, segundo o qual essas reformas são essenciais ao país. O MBL ataca constantemente organizações e movimentos de trabalhadores, como a CUT, o MST, MTST, entre outros que define como a extrema-esquerda. Com a intensificação dos protestos contra o governo Temer, devido a aprovação da PEC 55 e o trâmite das outras reformas pretendidas, acredito que os ataques às organizações de trabalhadores e estudantis, por parte desses grupos de direita, tendem a se intensificar.

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