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Diário Liberdade
Sábado, 22 Julho 2017 08:43

Carlos Sixirei Paredes: “Tinhamos na Universidade mais conhecimento do Brasil no tardofranquismo que agora”

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País: Galiza / Reportagens / Fonte: PGL

[Carlos C. Varela] O americanista Carlos Sixirei Paredes, profundo conhecedor da história do Brasil, vem de dar ao prelo o livro Un modo de ver las cosas: ‘La imagen periodística del Brasil de Lula através del diario El País’ (Vigo, ir indo 2017), trabalho que, com certeza, ajudará também a compreender a maneira de olharmos o Brasil na Galiza.

Conversamos com isto para o PGL com o seu autor.

Segundo você explica, nos “anos dourados” do El País, este jornal era referencial em todo o âmbito hispanoamericano, e com o seu giro conservador converteu-se em um construtor das coordenadas mentais com as que os seus leitores e leitoras “pensamos” América do Sul, outorgando patentes de legitimidade democrática e classificando os seus governos segundo o seu grau de “fiabilidade”. Conserva o El País atual esse poder de construção da percepção espanhola de América do Sul ou está a perdê-la?

Eu penso que a situação do El País empiorou com respeito à informação iberoamericana. Agora é menor. Antes, ademais de avondosas notícias apareciam múltiplas reportagens, bem intencionadas ou não, mas havia uma informação fluída e variada ainda. Logicamente, que com consideráveis diferenças de uns países a outros. No caso do Brasil houvo um incremento notável de notícias na época de Lula, logo decaiu um pouco o interesse. Na realidade tanto o número de notícias como a visão que se dava dos países respectivos tinha muito a ver com a presença dos investimentos espanhóis além mar. Se as empresas eram bem tratadas, o que quer dizer que não tinham uma grande pressão fiscal, nem ameaças de limitar as suas atividades, ou mesmo de serem nacionalizadas, a visão era positiva. Quando acontecia o contrário, “canha ao loro até que fale inglês”, como se diz. Por exemplo os Kirchner estiveram no olho do El País quase desde o princípio, o que contrastava com a visão positiva com que se tratava ao Chile pós-Pinochet. Eu dediquei vários trabalhos a estes tratamentos que estão publicados. Em concreto analisei a visão que dava o El País da Venezuela de Chávez nos três primeiros anos de mandato, do Peru de Alan García e da Colômbia dos anos noventa. E há consideráveis diferenças. De todos jeitos esse jornal é mui seletivo também com respeito aos países. Sem falar de Iberoamérica, sabias que o El País publica três vezes mais notícias sobre Marrocos que sobre Portugal?

Uma das distorções perceptivas que mais repete o El País a respeito do Brasil é apresentar o Partido Social Demócrata do Brasil como uma força ideologicamente equivalente à socialdemocracia europeia em vez de à direita. Posto que é impossível atribuir isto à ignorância, que é o que procura a cabeceira madrilena com essas confusão interesseira?

Eu creio que se deve à pertença a esse partido de Fernando Henrique Cardoso, grande amigo de Felipe González e, em tempos, mestre de uma geração de historiadores, politicólogos e sociólogos. Eu mesmo, como muitos universitários espanhóis da minha geração, tive uma visão de Iberoamerica mui influenciada pola obra de Cardoso, especialmente por ‘Dependência e desenvolvimento em América Latina’ (1970). Por então Fernando Henrique, que sofreu exílio durante a Ditadura, era um dos intelectuais, de esquerda mais sobranceiros do continente. Com o tempo foi girando e o giro definitivo produziu-se quando assumiu a carteira de Fazenda no governo de Itamar Franco (com anterioridade tinha sido ministro das Relações Exteriores). Foi o responsável do plano Real que conseguiu estabilizar a moeda brasileira em um intre em que a hiperinflação atingia o 2400% de aumento ao ano. A sua sona de homem progressista não o abandonou nunca por mais que deixara de sê-lo. E isso, junto à sua amizade com Felipe González, foi o que levou o El País a qualificá-lo de socialdemocrata junto ao seu partido, que é claramente um partido de direitas, apoiado por empresários e fazendeiros. Agora mesmo, com todo o rebúmbio político que existe no Brasil, as posições do PSDB são claramente conservadores e reacionárias.

E como foi variando no El País a apresentação de Inácio da Silva “Lula” e do Partido dos Trabalhadores?

Lula era visto como um radical em um intre em que, trás os desastres dos noventa e o fracasso estrepitosa das políticas neoliberais que arrastaram à quebra países como a Argentina e a piques estiveram de levar por diante outros como o Brasil, Colômbia, Venezuela, México ou o Uruguai, emergiam políticos reformistas de discurso radical mas de práticas políticas não tão radicais, e que foram mui logo alcumados de “populistas” no mais pejorativo sentido da palavra. Lula juntava todas as características para ser temido: vinha de liderar um sindicato, mantinha um discurso duro e radical, era um obreiro, não estava vencelhado aos tradicionais centros de poder. Pola primeira vez no Brasil havia um candidato à presidência da República com possibilidades de ganhar que não era um Bragança implícito ou explícito.

Logo o leão não foi tão fero como o pintavam. O reformismo petista foi bastante limitado e concentrado em programas sociais que no fundo não implicavam nem grandes transformações nem maciças transferências de renda em benefício dos mais pobres. A famosa história de que Lula sacou a dez milhões de pessoas da pobreza não é de tudo verdadeira. De facto o que houvo aí foi a convers4ao de dez milhões de pobres miseráveis em pobres subvencionados, não miseráveis, a base de programas como “Fome Zero”, “Minha casa, minha vida” e assim por diante, mas que não deixavam de ser pobres como se evidencia na atual crise brasileira em que as cifras de pobreza voltaram aos tempos pre-Lula. Ainda assim aqueles programas, enquanto durarom, foram bons. Mas nem houvo reforma agrária, nem recuou a violência urbana, nem nas favelas se conseguiu dar títulos de propriedade sobre as suas vivenda aos seus habitantes… Foi um conjunto de políticas, mais que fracassadas, incompletas, e sobretudo, descontinuadas.

Ora bem, nos anos de Lula, especialmente na segunda presidência, o Brasil atingiu níveis desconhecidos de crescimento económico e de prestígio internacional; o presidente consagrou-se como um líder mundial confiável. E o El País, que inicialmente o via com desconfiança, ao perceber as excelentes relações de Lula com as grandes multinacionais espanholas (Telefónica, Banco de Santander, Repsol, et cétera) passou a encumeá-lo como exemplo do que era um bom esquerdista: aquele que não altera substancialmente a relação de forças. Sobretudo Lula era para o El País o anti-Chávez. E sempre contrastava a política dos dous. Polo demais Lula tivo mui boas relações com os governos espanhóis de então, tanto com Aznar como com Zapatero (com este último extraordinariamente cordiais) e, desde logo, com os empresários espanhóis. Estava-lhe mui agradecido a Emilio Botin, a quem sempre chamou Dom Emílio, porque o banqueiro botou-lhe um capote durante a campanha eleitoral de 2002, do mesmo jeito que Emilio Botin pai botara outro a Felipe González na de 1982. Com tais avais, o El País, não podia fazer outra cousa que render-se a Lula.

No seu livro fica de relevo a grande importância da religião na política brasileira, a “guerra de deuses” da que escreveu Michael Löwy. Como valoriza o grande crescimento do evangelismo no país? tem a ver com uma estratégia para restar influencia ao movimento da Teologia da libertação?

Certamente, o crescimento do evangelismo em Iberoamérica não é alheio ao interesse dos estados Unidos por frear o desenvolvimento de um catolicismo progressista pós-concílio. E a verdade é que tiveram sucesso. Mas também a própria Igreja Católica botou uma mão com os erros cometidos por uma parte pola incapacidade para chegar aos mais desfavorecidos e por outra por carência de pessoal. O espetáculo que evidenciam as igrejas – ou algo assim – evangélicas é abraiante. Imagina uma vila do tamanho de Ordes ou Carvalho, onde na rua principal, sem contar outras topas 12 ou 14 locais que são os templos de diferentes confessões evangélicas e todas odiando-se entre si. O espetáculo nojento para conseguir fieis (que é sobretudo conseguir dinheiro) de pastores em feiras e festas insultando-se entre si é abraiante para um que vem de fora. O pior da situação é que ja penetraram na classe média, à que lhe vem mui bem uma religião individualista que se define polo não e não polo sim. Polo não a tudo o que não querem (aborto, casais homossexuais, et cétera) mas no que não se sabe o que querem agás uma nebulosa salvação pessoalizada, feita à medida. Por certo, jamais falam de corrupção. O que é lógico estando os evangélicos implicados em muitos casos.

Precisamente disso lhe queria perguntar, pois o seu livro pode ajudar a compreender as raízes da atual vaga de corrupção no Brasil. Até que ponto esta é estrutural, e como a visibiliza – ou não – o El País segundo os seus próprios interesses?

A corrupção no Brasil é endêmic. É-o desde a colónia. Quando a política é cousa de poucos (e continua a sê-la) a corrupção tem mais doada expansão. E afecta a todos os corpos do Estado e a todos os poderes. Por outra parte no Brasil o “jeitinho” continua a ser prática generalizada: como contornar a lei para conseguir soluções às demandas dos indivíduos que com a lei na mão poderiam obtê-las. E logo se justifica com um “tudo o mundo faz”. Como canta um samba. “se gritar pega ladrão/ não fica um meu irmão/ não fica um”. Na imprensa não é difícil denunciá-la nem tem tanto custo porque se limita aos casos individuais, não à corrupção geral do sistema e de boa parte da sociedade. A própria mídia forma parte desse sistema corrupto e polo tanto não o põe em perigo. Metemos uns quantos no cárcere e com isso já se lava a cara por um tempo. Até que a situação vire de novo em imanejável.

Nas eleições presidenciais de 2002 nove dos dezassete membros da Academia Brasileira das Letras, parceira da Academia Galega da Língua portuguesa, pediram publicamente o voto para a candidatura de Lula, quem agradeceu o apoio homenageando o fundador da ABL, Machado de Assis, lembrando que o escritor fora um mulato “que não teve título universitário”. É habitual que no Brasil o mundo académico intervenha em política?

Aquilo foi excepcional. Ademais não foi a Academia de Letras senão uns académicos a título individual. As instituições académicas não opinam oficialmente de política. Nas eleições municipais de 2012 a diretora da Orquestra Sinfônica da universidade de São Paulo, depois de acabar um concerto pediu desde a cena o voto para o candidato a prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, que trabalhava na instituição e ocupara o posto de Ministro de Educação com Dilma Rousseff e com Lula. Ao dia seguinte a diretora era demitida.

Há alguns anos Gilberto Gil, primeiro Ministro de Cultura de Lula, deu um concerto na praça do Obradoiro e dirigiu-se ao público em castelhano. Uma parte dos assistentes pediu que falasse em português, e o artista respondeu recriminando a atitude “nacionalista” do público. A polémica foi utilizada pela imprensa de direitas para carregar contra o galeguismo, enquanto que no Brasil, onde quase ninguém deveu saber do acontecido, um intelectual de Minas Gerais bom conhecedor da Galiza, Andityas Soares de Moura, saltou à palestra denunciando que “Gilberto Gil desdenhou e ridiculizou a cultura e a luta anti-imperialista de uma nação irmã”. Não sei se toda esta estória (a frustração da Galiza militante por um amor não correspondido por um Brasil que desconhece tudo de nós, com honrosas exceções)  não será uma boa metáfora da (não) relação entre a Galiza e o Brasil… ?

Imagino que Gilberto Gil, não tinha informação. De todos os jeito dir-lhe-ei que o nacionalismo que fomenta a separação de estados constituídos é visto com olhos pouco benévolos no Brasil. Ali defender publicamente que um Estado da união poda independizar-se é delito de lesa pátria e a quem o faga aplica-se-lhe a Lei Marcial. Em Rio Grande do Sul sabem-no mui bem. Daí que Gil interprete as manifestações nacionalistas (o emprego de uma língua própria, por exemplo) como reacionárias. Por outra parte Gilberto Gil ocupou o Ministério de Cultura com a frontal oposição da intelectualidade petista, que aspirava a que o posto o ocupasse um dos seus. Não tivo uma gestão doada, sempre baixo “fogo amigo”.

A realidade da Galiza como nação, não é tão conhecida no Brasil (não importa muito, nem sequer importa se Espanha é uma nação ou não) e a realidade de Gilberto Gil tão-pouco é tão conhecida entre nós. O que me estranha é a reação que tivo diante de um público que não lhe pede que fale em galego, senão que fale em Português. Galiza entra no Brasil por outros meios, que quiçá convinha ter em conta e não desprezá-los. Por exemplo, sabias que em São Paulo a cerveja estrangeira que mais se consume é a “Estrella de Galicia”? é a mais barata das foráneas e é melhor que as brasileiras. De facto já se fabrica ou engarrafa lá. Por exemplo na cadeia de doçarias “A Quinta do Marquês”; propriedade de um emigrante luso, e que é a de melhor qualidades da cidade, vendem todas as fim-de-semana milheiros de tortas de Santiago, com esse nome. Por exemplo na cadeia de supermercados Pão de Açúcar, que equivale ao que é Mercadona aqui, vendem carne produzida em Rio Grande do Sul que na envase põe em espanhol “carne de vaca rubia gallega” e leva como logotipo os hórreos de Vila Nova dos Infantes. Por exemplo, em uma vinhoteca que está frente ao apartamento onde moro quando vou por lá, tens vinho galego a maço… Pois essas cousas também se deveriam ter em conta e o nosso nacionalismo não sempre as tem e, por riba, desconhece-as.

O professor Antom Corbacho, autor de uma completa tese de doutoramento sobre a Diáspora galega no Brasil do Século XX, caracterizou a colónia galega no Brasil, face as suas pares na Argentina ou no Uruguai, como um coletivo menos definido e articulado. Para Corbacho a proximidade linguística fazia que a integração dos galego e galegas fosse mais rápida e fácil, havendo menos choque cultural – que era um dos fatores que nos outros países favorecia a afirmação nacional dos galegos -, à vez que a ausência de um conceito como o de “lusofonia” ou semelhante, que desse conta do vínculo galego-brasileiro, não precipitou um reforço identitário. Como percebeu, você, este fenómeno?

Discrepo um pouco de Corbacho. A cousa não foi tão assim em quanto a artelhamento ou a integração linguística. Outra cousa foi que no movimento associativo galego a palavra “galego” por chamar-lhe a um centro não foi mui usada. Preferirom criar “Centros españoles”. E isso acontece no Rio, em Santos, em São Paulo, no Salvador, et cetera. No Salvador existiam até não há muitos anos três centros associativos, incluindo um hospital, fundados por galegos. Nenhum deles levava o nome de “galego”. Chamam-se “Unión do Rio Tea”, “Caballeros de Santiago” e “Hospital Español”. Dos 13 centros existentes no Brasil quando eu publiquei o meu trabalho sobre o Asociacionismo Galego, tão só 3 levavam o nome de “galego”: os de Belém, Fortaleza e Paraná, que dá-me a impressão de que já não existem. Assim que não houvo tanta ausência de galegos criando centros, o que houvo foi a absorção de toda a emigração espanhola nas instituições criadas por galegos e daí que preferiram baptizá-las com o adjetivo “espanhol”. Depois ias ali e todo e eram referencias à Galiza. No de São Paulo a única imagem que não tinha a ver com Galiza era uma estátua da Virgem do Pilar. O resto eram Santiagos em diversas posturas e cartazes de Turgalicia. Há anos houvo um Centro Galego em São Paulo que eu ainda cheguei a conhecer em 1973. Estava formado por exilados e republicanos e era o lugar onde tinham as suas juntanças os democratas portugueses. Recomendo para um melhor conhecimento da emigração galega ao Brasil a leitura dos trabalhos de Marília Klaumann, de Pájaro Peres e o mui recente de Érica Sarmiento.

Estando ainda Moratinos de Ministro espanhol de Exteriores, viaja a Brasília para afortalar o ensino do espanhol nas escolas de secundária no Brasil, avançando passos legislativos mas com o obstáculo de carecer dos 20.000 docentes especializados que se precisavam. O El País, dedicou o editorial à questão, onde diziam “Para corresponder al singular apoyo que va a brindar a la lengua castellanna, el Gobierno brasileño ha pedido reprocidad al español para que potencie el português. Parece justo”. Em que ficaram esses projetos linguísticos? Soubo a Galiza tirar proveito deles?

Por parte de Brasil houvo um intento serio de impartir español nos níveis primário e secundário de ensino pero tinham um enorme déficit de professores. No intre atual existe un menor interesse sem contar com que os orçamentos de educação descerom notavelmente. Por parte de Espanha nunca houvo um intento sério (nem mesmo um plano a longo prazo) para introduzir em paridade o ensino do português agás no caso de Estremadura onde se ensina português por decisão do governo autonómico. Na Galiza nem se derom por aludidos quando poderia ser a grande fábrica de mestres e professores de espanhol com contratos para Brasil e a ponte para introduzir o ensino do português. Pero a carência absoluta de iniciativas no eido educativo ou cultural da Xunta é o habitual. Avonda só lembrar o acontecido hai 15 dias: Um neto de José Castro “Chané” cede uma grande coleção de arte contemporânea para ser exposta por dez anos em Toledo e Cuenca. O governo, ou algo assim, da Galiza nem un passo dou para traé-la para Galiza.

Usando a expressão de de Bruno Ayllón, as relações hispano-brasileiras caracterizaram-se por uma “mútua irrelevância” que iria tornando-se uma “associação estratégica”. Porém, no àmbito cultural parece que o nível de desconhecimento mútuo continua a ser elevado. Você mesmo tem descoberto como uma novela ganhadora há anos de um dos prémios literáriosmais prestigiosos do Estado espanhol reproduzia no primeiro capítulo de maneira calcadinha, as palavras de um livro brasileiro sobre a corte de João VI no Rio de Janeiro, sem que ninguém reparasse. Crê que há aí uma oportunidade para a Galiza fazer de ponte?

Se existe um fundo desconhecimento da cultura portuguesa que se desenvolve cabo de nós, já me dirás o que pode acontecer com o Brasil. Porém, e curiosamente, polo menos nos meios universitários, tinhamos mais conhecimento do Brasil no tardofranquismo que agora. Por então manejavam-se nomes que não eram só Pelé, Garincha ou Sócrates. Conhecia-se a Pereira de Queiroz, a Buarque de Holanda, a Guimarães Rosa, a Pedro Calmón, a Darcy Ribeiro, a Florestan Fernandes, a Glauber Rocha, aos artistas da bossa nova… havia obras de historiadores, sociólogos ou antropólogos traduzidos ao espanhol, especialmente na Editorial Siglo XXI de México, representaram-se obras de teatro brasileiro, viam-se filmes do Cinema Novo ou interpretava-se Villa-Lobos. Agora nem isso. Não sei quanta gente, na universidade, seria capaz de dar o nome de um escritor, de um investigador ou mesmo de um músico brasileiro. E falo da universidade. Em quanto ao livro de que falas, e não vou citar, quase é de agradecer que o copiasse. Polo menos sabia da sua existência e leu-no.

Temos os galegos Potencial para servir de ponte? Na teoria sim, só que a despreocupação de autoridades e instituições sobre o tema é grandiosa. Com essa carência não é de estranhar que se saiba tanto do Brasil em Lugo como em Sória. Se quadra para esta questão a solução está em Zara.

Já por último: no Brasil consideram-no a você o mais importante brasileirista do Estado espanhol (assim o diz Alessandro Soares da Silva), e leva anos indo de professor visitante à prestigiosa Universidade de São Paulo. Como ajudou a esta boa relação o galego, a língua comum?

A verdade é que ser o principal brasileirista da Espanha não é mui complicado nem muito importante, além de cárrega de generosidade excessiva que tem essa qualificação. Somos tão poucos… E por riba não mui bem vistos. O americanismo espanhol tem-se centrado basicamente no estudo da etapa colonial. Depois no nível de apreciação, vêm os contemporaneistas que também não são muitos agás os que se adicam a Cuba porque foi colónia espanhola até 1898. Se te adicas a áreas não hispanas não é que sejas um traidor, mas quase. Os politicólogos, neste eido, têm mais bula que os historiadores.

No Museu da Língua portuguesa, em São Paulo, começa-se com um mapa da Galiza e do Norte de Portugal mostrando o território como berce da língua. Em 1973, quando cheguei ao Brasil por primeira vez, na USP houvo uma mostra de imprensa em português. E ali estava, por exemplo, El Progreso de Lugo, inteiramente escrito em castelhano, mas que o incluíam por ser um jornal galego. Devo confessar que era o primeiro exemplar desse jornal que eu via diante. E já tinha 22 anos. Em um primeiro intre eu falava um galego aportuguesado, mas basicamente galego. Nas aulas perguntavam-me de que parte de Portugal eu era, pois era o primeiro português ao que lhe entendiam tudo o que dizia à primeira. Quando lhes dixem que era galego e morava na Espanha não acreditavam. Assim que para um estudante brasileiro era mais doado entender o galego que o português de Portugal com a sua nasalidade tão marcada.

Por aquela época já estava publicado o trabalho de Paz Andrade, A Galecidade na obra de Guimaraes Rosa, um grande autor Brasileiro, e na revista Grial apareciam de vez em quando trabalhos sobre literatura brasileira. Eu mesmo publiquei alguma cousa sobre Carlos Drummond de Andrade e Vinicius de Moraes. Foram umas notas necrológicas. A de Vinicius mui sentida, pois eu tinha alguma amizade com ele. Curiosamente sobre arte não lembro que se publicasse nenhum trabalho. Entre Brasil e a Galiza havia pontes culturais já daquela. Provavelmente mais do que hoje, mas poucos as transitavam. E a cousa não melhorou.

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